Competências em Experiência do Usuário no Design de Produto Digital

Um breve resumo da minha Tese de Doutorado

André Grilo, Ph.D.
8 min readMar 27, 2024

É com imensa alegria que compartilho a minha Tese de Doutorado em Design, desenvolvida na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), na área de concentração Design e Tecnologia:

GRILO, André. Competências em Experiência do Usuário no Design de Produto Digital: Perspectivas teóricas e uma pesquisa histórica cibercultural no Brasil (2000–2020). 2023. 440 f. Tese (Doutorado) — Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Escola de Engenharia / Faculdade de Arquitetura, Programa de Pós-Graduação em Design, Porto Alegre, 2023.

Imagem da capa de tese de doutorado de André Grilo. Ela é vertical, possui cor verde escura atravessada por uma faixa na cor preta com o título da Tese. Abaixo da faixa preta, há um espaço em um tom mais claro de verde, com o nome do autor posicionado à direita. No rodapé, uma faixa verde escuro, com o logotipo da UFRGS à esquerda e ano de publicação à direita.

O que é abordado na Tese?

Essa publicação é o resultado de uma pesquisa em epistemologia e praxiologia do Design, isto é, os estudos do conhecimento e da cognição do designer e da sua prática profissional.

Na perspectiva epistemológica, é explicado o conceito de competências profissionais e como designers as desenvolvem. Essas competências são abordadas relacionando dois conceitos: Design de Produto Digital e Experiência do Usuário.

Além do aspecto teórico, também foi investigada a práxis de designers de produto digital relacionada à Experiência do Usuário (doravante UX), identificando os tipos de competências em UX e buscando entender: as maneiras como designers trabalham, relatando pesquisas aplicadas em contextos reais de prática; e de que forma designers aprendem sobre competências da profissão.

Destaco a seguir os principais pontos desenvolvidos na Tese.

As competências em UX

Esses são os tipos de competências em UX:

Fonte: Grilo (2023, p. 362)

Por meio do mapeamento e análise da literatura especializada produzida ao longo de duas décadas (2000–2020), identifiquei tipos específicos de competências: projetuais (P), tecnológicas (T), científicas (C), negociais (N), mercadológicas (M) e comportamentais (Co).

Mas o que são cada uma dessas competências? De que maneira designers as desenvolvem? Qual a relação entre as competências dos designers e a experiência do usuário? Na parte 1 da Tese (capítulos 1 ao 5), abordei essas questões.

Qual perfil de designer esta pesquisa enfatizou

Você já deve ter visto essa imagem circulando por aí também, né?

Fonte: Jaworski (2023)

O mercado criou tantas siglas e definições com o passar dos anos, que a área ficou com delimitações um tanto gelatinosas.

Esses nomes de cargos muitas vezes advieram de profissionais da área de Computação, Marketing, Comunicação e outros campos, e representam suas respectivas maneiras de enxergar o Design — principalmente o modo com o qual as empresas no geral compreendem o papel do designer. Era oportuno, então, desenvolver uma visão crítico-reflexiva do sobre a profissão pela teoria do Design.

Estudei as diferentes áreas e suas denominações e escopos, propondo a convergência delas para o Design de Produto Digital, uma subdisciplina que possibilita reunir Design de Interação, Design de Interface, UX Writing, Arquitetura de Informação e outras denominações e especialidades.

Na minha tese, propus uma teoria que sistematiza o conceito de UX e o coloca como um construto na subdisciplina Design de Produto Digital, logo,

esta não é uma tese sobre UX Design. É justamente uma proposta teórica que diverge desse conceito,

uma vez que experiências são idiossincrásicas e, portanto, não são projetáveis ou controláveis. Não existe um design da experiência, mas um design para (A) ou pela (B) experiência.

Fonte: Adaptado de Grilo (2023)

A experiência do usuário não é o objeto projetado pelo designer, mas uma consequência, um fenômeno decorrente do uso do objeto que foi projetado.

O objeto (que pode ser um produto digital), quando no contexto de uso, convive com elementos externos ao controle do designer, os quais também afetam a experiência de uma pessoa.

Fonte: Grilo (2023, p. 107)

O designer de produto digital aqui teorizado se distingue do “product designer” que a indústria disseminou nos últimos anos. O termo “produto”, em Design, não consiste apenas em uma dimensão do negócio e das métricas, mas em uma noção abrangente do projeto de um artefato, considerando os aspectos reflexivos, culturais e simbólicos da ação projetual do designer (Schön, 1983; Buchanan, 1992; Love, 2000; Löbach, 2001; Gomes Filho, 2006; Cross, 2007; Bonsiepe, 2011).

Teoricamente, denominei a relação entre esse perfil de designer e a UX de “Designer em UX” (calma, não é mais um novo job title, é apenas um conceito teórico para sintetizar a ideia).

Outros tipos de experiência no Design

A UX é um dos vários tipos de experiência relacionados ao Design, pois existe uma diversidade de atores no ecossistema de produtos e serviços digitais. Em um aplicativo de entrega, por exemplo, o entregador, a equipe do restaurante, o cliente, o fornecedor e outros atores vivenciam experiências — tecnológicas, econômicas, socioculturais, entre outras — distintas, tanto com o produto digital quanto com o serviço que está por trás daquela aplicação.

Assim, mesmo que a ênfase aqui seja a experiência do usuário, a qual é fundamental ser catalogada na teoria do Design, esta pesquisa considera a convivência desse construto com outras formas de experiência no entorno do design de um produto digital. Cada vez mais, por meio do pensamento sistêmico nos processos de projeto, novas relações de experiência podem emergir, requerendo novas competências dos designers.

Produtos Digitais < Serviços Digitais

O recorte de investigação enfatizou os produtos digitais, porém destacando o Design de Produto Digital enquanto uma subdisciplina do Design inserida no domínio dos serviços digitais. Não se deve perder de vista que os serviços digitais são o nutriente essencial de tecnologia e de negócio que habilitam a existência e a cadeia de valor dos produtos digitais.

Fonte: Grilo (2023, p. 77)

Por essa razão,

É necessária uma educação capaz de formar profissionais competentes em projetar produtos digitais…

…porque os serviços são tangibilizados também por meio de produtos que designers projetam. Outrossim, designers de produto digital devem entender de serviços digitais para saber como operacionalizá-los e materializá-los nas interfaces e interações de tais produtos. As competências em UX atuam na direção desse objetivo.

Experiência do Usuário no Brasil

Antes de o termo “UX” se popularizar, designers tiveram muitas denominações e rótulos. Muita gente já trabalhou como Web Designer ou Arquiteto de Informação, por exemplo. Também levou bastante tempo para que os profissionais ganhassem espaço e para que a Experiência do Usuário fosse uma pauta no desenvolvimento de produtos digitais.

Conversei com profissionais que atuam desde o início da internet no Brasil, como a Amyris Fernandez e o Michel Lent, além de realizar uma apuração e análise de textos de profissionais da área e um fichamento e transcrições do documentário dirigido em 2015 por rené de paula jr, “Guia dos Perplexos”, importante material histórico que narra a trajetória de diversos profissionais de internet no país. Também conversei com profissionais seniores como a Lu Terceiro, Edu Agni, Stefan Martins, Rodrigo Medeiros e outras pessoas que relataram como surgiram as primeiras comunidades, cursos e eventos da área no país. Com esse levantamento e triangulação, pude traçar um contexto histórico de como o conceito de UX se consolidou no mercado brasileiro e como o conhecimento da profissão se erigiu.

Da esquerda para direita: Michel Lent, Amyris Fernandez, Luciana Terceiro, Rodrigo Medeiros, René de Paula Jr., Edu Agni, Stefan Martins.

Cibercultura da UX

Cibercultura é uma cultura que ocorre no ciberespaço, habilitada pela conexão mundial de computadores advinda da web. Esse fenômeno se baseia em interconexões, comunidades virtuais e inteligência coletiva (Lévy, 1999).

Na Cibercultura da UX (Grilo, 2023), três construtos são observados na comunidade profissional de designers:

  • o conectivismo: aprendizagem por meio de conexões em rede e conhecimento armazenado nas pessoas e nas máquinas (Siemens, 2005);
  • a curadoria de conteúdo: seleção, organização e distribuição da informação na web pelas pessoas (Dale, 2014); e
  • a educomunicação: que é a educação pelos meios de comunicação, que possibilita a mediação tecnológica na aprendizagem (Soares, 1999; Consani, 2008; Lima, 2009; Martini, 2019).

Por meio de blogs, podcasts, vlogs e outros formatos, designers brasileiros promovem o conhecimento sobre a profissão no Brasil, prática que começou nos anos 2000 e que atravessou por anos até o crescimento e consolidação da área no mercado. Esses profissionais são cibercultores, que realizam a curadoria e educomunicação do conteúdo sobre UX.

Dinâmica da Cibercultura da UX (Grilo, 2023, p. 228)

Nesse fenômeno, as pessoas que acessam e interagem com os conteúdos, por meio de comentários, compartilhamentos e contribuindo com seus repertórios, também se tornam cibercultoras da UX, ampliando e amplificando o conhecimento em rede (provavelmente, você também é uma cibercultora ou um cibercultor).

Existem inúmeros tipos de iniciativas ciberculturais. Por exemplo, as listas com “10 passos para começar em UX” são curadorias de conteúdo. As lives de mentoria sobre como fazer um portfolio, as dicas de especialistas em um podcast ou aquele tutorial de Figma, são formas de educomunicação. As iniciativas ciberculturais da UX e toda a sua variedade ajudam a explicar a cultura e a educação do mercado brasileiro de Design de Produto Digital.

Tive a oportunidade de receber depoimentos de cibercultores pioneiros que criaram os primeiros sites, blogs e vlogs por meio dos quais a Experiência do Usuário se disseminou no Brasil. Analisei dezenas de iniciativas ciberculturais produzidas ao longo de duas décadas (2000–2020), identificando produções de conteúdo que marcaram gerações de designers no país (algumas existem até hoje).

Dentre os diversos pioneiros convidados, Bruno Rodrigues, Fabricio Teixeira, Irla Bocianoski Rebelo, Guilhermo Reis, Mercedes Sanchez, Luiz Agner e Daniel Furtado participaram da pesquisa e relataram suas trajetórias como cibercultores da UX no Brasil.

Da esquerda para direita: Bruno Rodrigues, Fabrício Teixeira, Irla Rebelo, Guilhermo Reis, Mercedez Sanchez, Luiz Agner, Daniel Furtado

Os depoimentos e achados dessa pesquisa podem ser conferidos na íntegra na parte 2 da Tese.

Este foi um panorama sobre a Tese. Em textos futuros, vou aprofundar o tema e compartilhar outros achados e reflexões interessantes. Enquanto isso, você pode baixar gratuitamente a Tese no links para download abaixo:

📄 Download: Repositório UFRGS | Academia.edu

E se você conhece mais pessoas que se interessam pelo tema, seja para aprimoramento profissional ou seja para estudos acadêmicos, compartilha esse conhecimento com elas. 😉

Desejo que esta Tese seja um material útil a todas as pessoas que estudam e atuam com Design de Produto Digital e Experiência do Usuário.

Boa leitura! 📖

André Grilo, Ph.D.
Doutor em Design
Universidade Federal do Rio Grande do Sul

As referências citadas neste artigo estão listadas na Tese.

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André Grilo, Ph.D.

Design, Educação e Cibercultura. Reflexões sobre Design de Produto Digital e Experiência do Usuário.